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Russian Roulette: Parte 02

Conhece este conto e lĂȘ a parte anterior em Russian Roulette.
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Cinco dias antes
Acordei na minha cama tapado com uma manta, ouvi a voz do meu pai e do Jack, estavam a conversar, apesar das dores fiquei calado para ouvir.
- Jack, eu estou-me a cagar se ele gosta de rapazes ou raparigas! É meu filho, sangue do meu sangue, nunca o vou abandonar. – Aquelas palavras do meu pai deixaram-me emocionado, comecei a chorar silenciosamente. – Eu quero Ă© apanhar os cabrĂ”es que lhe fizeram isto.
- Garanto-lhe que eu tambĂ©m! – Ouvir o Jack a defender-me era importante. – Se eu soubesse quem foram estes filhos da puta ... Peço desculpa pela linguagem!
- NĂŁo precisas rapaz, entendo perfeitamente. Se nĂŁo fosses tu a ajudar o meu filho nĂŁo sei o que lhe tinha acontecido. Muito obrigado.
- O seu filho Ă© uma grande pessoa, ele nĂŁo merecia isto … - O Jack nĂŁo podia ser mais querido.
- Tu e ele, sĂŁo .... – Ele ia fazer a pergunta. Tentei controlar o choro, queria ouvir a resposta. – Desculpa a pergunta, mas vocĂȘs jĂĄ se envolveram?
- NĂŁo senhor, nunca! – Disse Jack rapidamente. – O seu filho Ă© um Ăłtimo colega e uma grande pessoa.
- Peço desculpa entĂŁo. Mas gostas dele? – Ele nĂŁo podia estar a fazer aquelas perguntas, ia acabar por o afugentar ou pior. Pensei mexer-me, mas a curiosidade falou mais alto e esperei.
- Eu gosto de pessoas! – Afirmou ele sendo vago.
Fingi que estava a acordar, ambos notaram e aproximaram-se da cama, o meu pai perguntou-me como estava, disse-lhe que tinha dores e que queria falar com o Jack sozinho, o meu pai compreendeu, aceitou e saiu, fechando a porta do quarto.
De pé, ao lado da cama, estava o Jack a olhar-me fixamente com a cara fechada, tinha a mesma roupa de ontem e notava-se algum cansaço. Pedi para ele se sentar na cama e contar-me tudo o que tinha acontecido depois de ter desmaiado nos braços dele.
Fiquei a saber que me vestiu com a roupa dele do treino e me levou em braços até ao hospital, depois esperou a noite toda na sala enquanto me faziam exames, como ficou com o meu telemóvel, e eu não tenho código de acesso, ligou para o meu pai e contou tudo, pediu-me desculpa se não era isso que eu queria, mas eu não me importei. Depois vim para casa e dormi quase por quinze horas, ele ficou sempre aqui.
Depois perguntou-me se tinha sido o Frank e o seu grupo a violarem-me, nesse momento fomos interrompidos pelo meu pai que queria saber se podia deixar a Amy entrar, olhei para o Jack e depois para o meu pai, disse-lhe que sim mas para nĂŁo mencionar o facto do Jack estar ali, ele ficou na dĂșvida mas concordou, voltou a sair e fechou a porta.
- Eu entendo se nĂŁo quiseres ser visto comigo … - Falei olhando para as minhas mĂŁos. – Mas eu ainda preciso de falar contigo. SerĂĄ que podes ficar ali na casa de banho, uns minutos? Eu prometo que ela nĂŁo demora.
- NĂŁo tenho problema nenhum em ser visto contigo, mas aceito. – Disse esboçando um leve sorriso. – Depois chama-me que eu volto. – Foi em direção Ă  minha casa de banho, entrou e fechou a porta.
Dois minutos depois entrava a Amy, bastante simpåtica e preocupada enquanto falava com o meu pai, reparei que este olhou em volta à procura do Jack, mas não mencionou o assunto. Correu para junto de mim e abraçou-me, depois quis saber se era mesmo verdade o boato que andava a circular na escola de eu ter sido violado. O meu pai pediu licença e saiu deixando-nos sozinhos.
- Agora que jĂĄ estamos sozinhos vou ser direta, estou farta de ser sonsa! – O seu tom de voz alterou, parecia uma pessoa diferente. – O Frank e o bando deixaram-te o cu muito arrombado? – Depois riu sinicamente.
NĂŁo estava a compreender o que se estava a passar e tentei perguntar-lhe, nĂŁo obtendo resposta, ela estava no seu monologo previamente decorado e nĂŁo ouvia o que perguntava, reparei que a porta da casa de banho se abriu discretamente, o Jack estava a ouvir.
- Pelas imagens que vi a foda foi gostosa! – Riu-se enquanto tirava do bolso um telemĂłvel. – Os cabrĂ”es a mim nunca me foderam assim, atĂ© tenho alguma inveja tua.
Mandei-a parar, ela riu-se ainda mais e colocou o vĂ­deo a reproduzir, disse enquanto eu relembrava aquele momento terrĂ­vel que a ideia tinha sido dela, era uma forma deles se divertirem um bocadinho, aquilo estava a dar-me vĂłmitos.
Nesse momento tudo aconteceu muito råpido, vi o Jack a sair disparado em direção a ela, apanhou-a desprevenida, as mãos dele agarram-se ao pescoço dela enquanto a arrastou até à parede, o telemóvel caiu ao chão, estava a sufocå-la, não o podia deixar fazer isso, gritei o seu nome e ele olhou para mim, pedi-lhe para parar, os seus olhos estavam abertos, ele estava a defender-me, depois soltou-a. Esta caiu agarrada ao pescoço enquanto recuperava ar.
- O Frank ... eles … eles vĂŁo saber disto! – Ameaçou-nos, enquanto fugia. O seu telemĂłvel ficou lĂĄ.


Quatro dias antes
Acordei, ainda estava dorido, não tinha vontade de me levantar só queria ficar ali trancado sem ver nada nem ninguém, eu sentia-me um lixo, um bocado de merda, não seria capaz de voltar a encarar as pessoas na escola, pelo menos por agora.
O pai bateu Ă  porta e disse-lhe para entrar, perguntou-me como estava, respondi-lhe e depois informou-me que ia trabalhar, mas caso precisasse de alguma coisa para lhe ligar imediatamente, disse-lhe para ir descansado, eu ia ficar bem. Despediu-se e saiu, estava sozinho, pensei ligar ao Jack, mas nĂŁo podia meter-me mais na vida dele, sabe-se lĂĄ as consequĂȘncias que surgiriam do que aconteceu, resolvi ficar quieto.
Saí da cama e fui em direção à casa de banho, ia olhar-me ao espelho pela primeira vez depois daquilo. Tinha a cabeça baixa, estava com vergonha de mim, ganhei coragem e olhei para cima, o reflexo do que vi deixou-me nauseado, uma cara com nódoas negras, um corpo violado, tocado, maltratado. Não aguentei e vomitei para o lavatório, as lågrimas começaram a cair, precisava de mudar e assim tomei uma decisão radical, ia rapar o cabelo, aquele que fora tocado e puxado por monstros.
Corri para a casa de banho principal e peguei na mĂĄquina de cortar o cabelo que o meu pai utiliza, levei-a para o meu quarto, liguei na tomada ao lado do espelho, olhei uma Ășltima vez para o meu cabelo castanho, peguei na mĂĄquina e comecei a passar pela cabeça, o cabelo ia caindo Ă  minha volta, as lĂĄgrimas escorriam-me pela cara enquanto relembrava o que tinha acontecido, sĂł me perguntava o porquĂȘ de me fazerem aquilo, eu nĂŁo fazia mal a ninguĂ©m, estava sossegado no meu canto, o Ășnico som que se ouvia era o da mĂĄquina, olhei-me ao espelho e a minha figura estava a mudar, jĂĄ nĂŁo parecia um idiota que gosta de rapazes, naquele momento senti a minha expressĂŁo endurecer, forte por fora, frĂĄgil por dentro. Quando terminei limpei o que tinha sujado, parecia outra pessoa, foi reconfortante nĂŁo parecer o David, eu nĂŁo queria continuar igual, precisava de uma nova vida, uma nova identidade.
Tocaram Ă  campainha, num impulso pensei no Jack e corri para a porta ignorando as dores, nĂŁo olhei e abri, quando vi quem era fiquei surpreendido.
- OlĂĄ, como … - Fez uma pausa, olhando para o meu cabelo. - … estĂĄs? O diretor de turma disse-nos que estĂĄs doente e perguntou quem poderia trazer-te a matĂ©ria destes dias, eu voluntariei-me, espero que nĂŁo te importes. – Disse ela sorrindo.
- OlĂĄ Beth, estou ligeiramente melhor, obrigado. – Agradeci. Para ser educado, apesar de querer ficar sozinho convidei-a a entrar. – Queres entrar e tomar alguma coisa?
- Se me puderes dar um copo com ĂĄgua, agradeço. – Sorriu timidamente.
Deixei-a passar e fomos para a sala, acendi a televisĂŁo, ela posou os apontamentos na mesa, pedi-lhe para se sentar enquanto fui buscar a ĂĄgua. Quando voltei sentei-me tambĂ©m no sofĂĄ e passei-lhe o copo, depois quis saber o que tinha acontecido na minha ausĂȘncia de mais significativo naqueles dias.
- SĂł se fala de uma coisa agora por aquelas bandas! – Pensei logo que fosse o que me tinha acontecido, mas pelos vistos ninguĂ©m sabia. – A equipa vai dar uma megafesta, Ă© o Frank e o Jack que estĂŁo a organizar. – Ao ouvir aquilo fiquei sem reação, ela nĂŁo compreendeu. - Ainda hoje estavam todos aos risos lĂĄ no bar. – Concluiu. – A festa Ă© daqui a trĂȘs dias, achas que estarĂĄs bom para ir? – Perguntou curiosa.
A minha concentração ficou-se pelo facto do Frank e do Jack estarem bem, não podia acreditar que aquilo tinha sido tudo encenado, as lågrimas ameaçavam cair.
- Eu nĂŁo gosto de festas. NĂŁo irei! – Respondi diretamente. – Agora desculpa, mas tenho de sair, desculpa estar a despachar-te, mas tens de ir embora.
- NĂŁo hĂĄ problema, eu tambĂ©m nĂŁo podia ficar mais tempo. Obrigada pela ĂĄgua. – Sorriu e depois deu-me um beijo demorado na cara. NĂŁo esperava aquilo. – AtĂ© breve. – Depois saiu deixando-me perdido nos pensamentos sobre o Jack.

O que acharam? O que irĂĄ acontecer a seguir?

Diogo Pereira Mota

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